terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

É a lentidão Estúpido!

Talvez nunca como hoje as pessoas desconfiaram da justiça... Tal descrença deve-se essencialmente a 2 motivos: (1) às notícias sobre justiça diariamente veiculadas na comunicação social, sobre os (impunes) Isaltinos, BPNs, Freeports, Face Oculta, etc. mas também a notícias como esta:
tribunal-esteve-duas-horas-a-julgar-furto-de-comida-para-cao-e-gato
dando conta da condenação de uma meliante que furtou 2 embalagens de comida para animais, no valor de € 0,98... mas, e sobretudo, também (2) pela própria experiência vivenciada pelas pessoas que tiveram de recorrer aos n/ tribunais, ficando anos à espera de uma sentença que (não obstante estar irrepreensível), passado tanto tempo, apenas serve para emoldurar numa qualquer parede da casa de banho...porquanto perdeu o seu efeito útil. Se recorremos ao Tribunal para condenar a empresa Vai Chatear Outro Lda. a pagar-nos € 50.000,00 e temos uma decisão passados 3 anos, quando a empresa já dissipou todos os bens e está pronta para fechar as portas, então mais valia termos ficado quietos ou então, violando o art. 1.º do CPC que prescreve "A ninguém é lícito o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio direito (...)", contratar uns tipos musculados para darem uns açoites ao mau pagador...

Desta descrença grave nos Tribunais e nos magistrados avultam perigos que a classe política não deve/pode ignorar. Desde logo, como já referi, esta ineficácia apela ao recurso à vindicta privada por parte dos lesados... A justiça pelas próprias mãos é inimiga jurada do Estado de Direito. O Estado não pode abdicar daquela que é a maior demonstração da sua força - o poder de punir os cidadãos que violem a lei...

Por outro lado, quando as pessoas vêm uma justiça mole, que demora anos e anos a decidir e que põe na rua um criminoso da pior estirpe devido a um erro processual (que os advogados mais argutos sempre aproveitam), são convidadas a enveredar pela via do crime (mormente numa época de crise como a que vivemos). Ao contrário do que alguns ainda acreditam, não é a gravidade/medida da pena (e cada vez se vêm mais partidários da pena de morte) que desviam as pessoas da actividade criminosa mas antes a certeza e a celeridade da pena... Um criminoso, antes de partir para um assalto à mão armada, não pensa 2 vezes apenas pelo facto desse crime ser punido com 10 ou 20 anos de prisão, todavia, se tiver no subconsciente que em Portugal 90% dos assaltantes são apanhados, condenados e presos em menos de um ano, de certeza que pensa muito bem se vale a pena cometer o crime. E não sou eu que o digo, esta tese, gizada por Montesquieu, tem quase 300 anos...

Face às consequências nesfastas que o descrédito na Justiça acarretam, urge pois uma reforma profunda, sobretudo do Código de Processo Civil, que privilegie a substância em detrimento da forma, que reduza os articulados, o número de testemunhas, os incidentes, etc. mas mais do que isso é necessário uma reforma de mentalidades dos vários operadores judiciários (juízes, MP, advogados, solicitadores, oficiais de justiça, etc.) que têm que fazer mais com as ferramentas de que dispoêm... De contrário podem fazer as alterações legislativas que quiserem que não sairemos da cepa torta... pois "a terra continuou a girar à volta do Sol, apesar de Ptolomeu ter convertido em lei o contrário..." (Kirchmann).

LP

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